segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Money for nothing

Hoje vi a cena mais irónica de sempre.

Pelo Porto, perto de uma pastelaria qualquer saíram duas mulheres idosas, uma delas teria pago o lanche à outra, então, a mulher que se sentia obviamente inferior à que pagou o lanche, (sendo que o dinheiro na nossa sociedade tem a particularidade de fazer outras pessoas sentirem-se mal) fazia de tudo para que a que pagou o lanche aceitar o dinheiro. Tratava-se de uma nota de 5 euros se a vista não me engana e ambas diziam: "Mas eu não quero!" depois de uns "Deixa lá isso" e uns "Oh, nem pensar!"... Na confusão da rua típica tripeira estavam dois desgraçados a pedir, com meia dúzia de moedas nas mãos e três cães encostados a eles. As mulheres passaram este cenário a menos de um centímetro de distância. Posso dizer que uma das mulheres deve ter quase tropeçado na perna do homem que pedia, como eu que estava atrás, quase o fiz.

Não me interessa que vida tem o gajo que estava a pedir, nem a vida destas mulheres. Mas esta situação é sem dúvida, das mais irónicas que presenciei e parecendo que não é mesmo comum.

Quando era criança ia a um restaurante em Matosinhos e havia um homem que dormia na rua mesmo ao lado do restaurante. Tenho a certeza que o homem não faz ideia a quantidade de vezes que me fez chorar até que, mentira ou não, me contaram que ele era mesmo feliz assim e que alguns lares já o tinham tentado ir buscar mas que o tal senhor dizia sempre que não e que era feliz assim. Eu aceitei aquilo. E lembro-me que a última vez que o vi, dei-lhe um grande sorriso.. Porque sabia (ou pensava) que ele era realmente feliz.
As pessoas vão-se habituando a ver aleijados e pedintes na rua e aprendem a não sentir rigorosamente nada ao vê-los. De longe a longe aparece um gajo com umas feridas novas que chamam a atenção mas se amanhã ainda lá estiver, temos pena meu amigo mas já ninguém quer saber. Já vi uns quantos malandros pela rua a pedir para instituições até! Já vi pessoas a pedir, nitidamente para droga. Já vi quem usasse animais ou crianças para pedir. E não acho correcto. Pergunto-me se mais alguém olha e pergunta o que se terá passado. Tenho uma certa pena pelas pessoas que pedem, mas acho que tenho ainda mais pena das pessoas que não tem sequer coragem de pedir. Que não tem o que comer e ficam nos seus cantos sem que ninguém dê conta do sofrimento delas. Que esperam a carrinha da sopa chegar à Batalha porque essa é provavelmente a única refeição que vão ter nesse dia. Vamos esquecer as reencarnações e os pagamentos morais agora... Ninguém merece este sofrimento. é ridículo. Não podemos desculpar estas situações com argumentos como "Quem se mete na droga..." ou "Não quiseram trabalhar, só andaram na má vida..." Há mulheres que vivam da reforma do marido e quando o perdem ficam sem nada... há mães que são roubadas pelos próprios filhos por causa de dependências... há homens que são abandonados pelas mulheres por não terem um ordenado que se preze. há pessoas que tem acidentes, avcs ou pura e simplesmente envelhecem... e vamos todos co caralho meus queridos. E apesar de me custar a acreditar no karma, espero que as pessoas possam ver tudo isto. Um dia. Mas se for realista comigo, não tenho grande esperança.

Admiro as pessoas que conseguem ser felizes sem dinheiro. E espero pertencer a esse grupo até ir co caralho. Se tiver certas pessoas comigo e as necessidades básicas carregadas. Money for nothing my friends.

6 comentários:

  1. Pior do que isso tudo é não ajudar um pedinte e gastar 60 cêntimos mais IVA numa chamada ;)

    ResponderEliminar
  2. isto é complicado... há por aí arrumadores a pedir moedinha de cerveja numa mão e telemóvel noutra, soube q um ciganito q ia lá a casa quase todas as semanas recebia ordenado mínimo e uma outra senhora q tinha uma bruta duma quinta e andava a pedir pq era doente mental, palém d ter sido mandada abaixo d braga dp d oferecer a um pedinte q m veio tocar à porta uma saca com um pacote de leite e outro de massa... é complicado filtrar os q realmente precisam. ok, qual é q solução? recorrer a instituições de solidariedade... mas segundo disse um sem-abrigo numa reportagem q deu aqui há dias, mtas delas existem pa ganhar dinheiro... q caraças. keremos ajudar mas é difícil saber kem merece e precisa msm... e agora?...

    a propósito, outra coisa q m mete mta confusão é haver gente da minha rua q recebe da segurança social, diz q a vida tá má e vai tomar o pequeno-almoço à padaria todo o santo dia...

    n entendo...

    ResponderEliminar
  3. Há uns tempos pediram-me para fazer um texto a partir da leitura de uma imagem. O que mostrava era uma típica dondoca-plastificada-com-medo-da-lei-da-gravidade-que-lhe-vai-estragar-o-botox-semanal, cheia de sacos de compras - chanel, D&G, por aí - a passar ao lado de um mendigo, descalço, sem blusa e com os ossos todos marcados sob a pele.
    O que é que eu podia escrever ao olhar para aquela imagem?! Acho que uma simples frase resumia na perfeição: PUTA DE VIDA DESIGUAL!!!
    Acabei por escrever umas linhas, a falar da oposição entre a pobreza vs materialismo... Acabei com uma frase que me valeu o 20: Poderia passar o resto da vida a escrever sobre este tema, mas as palavras não enchem a barriga daqueles com que me cruzo na rua diariamente, portanto, não vale a pena...

    Beijinho

    ResponderEliminar
  4. haha este sansao é mesmo anormal x)

    eu um dia dei dois euros a um gajo à porta do hospital e no minuto seguinte vi-o numa loja a comprar um isqueiro pra fumar as suas cenas com os dois euros que lhe tinha dado. fiquei fo-di-da :)

    ResponderEliminar
  5. Andava aqui a vaguear na net, e vim parar a este blog já nem sei bem como. Após ter lido os teus textos, de onde consegui retirar sempre uma mensagem importante acerca de cada um deles, é com agrado que te digo que a maneira como escreves é cativante, e dá vontade de ler mais e mais =). Este texto sem dúvida foi dos que mais gostei. O meu escritor preferido August Cury, tem um livro chamado “ a saga de um pensador”. Este livro relata um pouco o tema que falaste neste texto, e sem dúvida que olho para as “pessoas da rua” de forma diferente, após a leitura daquele livro. Estudo em Evora, e há um senhor com os seus longos cabelos brancos, que não me é indiferente, apesar de ser um “pedinte”, transparece ser uma pessoa inteligente e misteriosa, dá-me vontade de me sentar e falar com ele. É um “mendigo” que me fez lembrar muito o que foi referido no livro, e neste momento o que foi falado também aqui. Dizem que era advogado, que perdeu a mulher e a família… e que aquela perda o afectou de tal forma, que agora está assim naquela situação. Quando me cruzo com ele na rua, faço-lhe um grande sorriso, ao qual ele retribui, e sem que ele saiba, aquele simples gesto me “enche” de forma inexplicável. Falei com a minha mãe, e comprei-lhe aquele livro que falei à pouco para lhe oferecer. Já o tenho a algum tempo, mas a coragem de o entregar ainda não chegou, não sei como vai reagir. Sinto que este teu texto, foi sem dúvida uma rampa para finalmente ganhar coragem de lhe escrever qualquer coisa, e entregar-lhe finalmente o livro ;)

    Continua a escrever =)

    Pipa*

    ResponderEliminar